Por Luchadoras

-O acesso à justiça para as mulheres vítimas de violência digital no México não existe – esta foi a principal conclusão da pesquisa Justiça em trâmite, o limbo das pesquisas sobre violência digital no México, que realizamos com o apoio da Indela.

Em vista da aprovação da Lei Olimpia como resposta mais visível promovida por coletivos de vítimas para atuar contra a divulgação de imagens íntimas sem consentimento, nós do coletivo Luchadoras nos questionamos se a lei representava um avanço tangível na vida das mulheres e chegamos às seguintes conclusões:

Lei Olimpia, qual o próximo passo?

A regulamentação excessiva da internet ameaça o exercício de nossas liberdades online e pode servir como ferramenta a autoritarismos para perseguir as críticas provenientes da sociedade civil organizada.  Entretanto, ao conversar com mulheres que foram vítimas de violência digital, constatamos que a denúncia penal de fato é uma via de atuação válida para elas. Mais de 2 mil mulheres denunciaram terem sido vítimas desse delito nos últimos três anos.

O delito que pune a divulgação de imagens íntimas sem consentimento já é uma realidade em todo o país. Nós do coletivo Luchadoras acreditamos que agora é necessário criar um padrão idôneo que permita harmonizar esses quadros legislativos.

Por outro lado, como demonstra nossa pesquisa, a impunidade e os desafios estruturais do sistema judiciário no México impediram o avanço dos casos de violência digital que foram denunciados.

Durante nossa pesquisa, juntamente com o OVIGEM em Puebla, conversamos com mulheres que foram vítimas de violência digital, que confirmaram a falta de respostas, de informações claras, os maus tratos e a revitimização por parte das autoridades.

Juntas também pensamos sobre o que significa “acesso à justiça” e descobrimos outros conceitos mais amplos e com maior potencial restaurativo do que a sanção penal. Colocar a reparação ao dano no centro também as coloca no centro.

As mulheres vítimas de violência digital precisam ter várias opções de atuação disponíveis além da via penal, a partir do direito civil, trabalhista ou administrativo, além de melhores opções de denúncia nas plataformas e mecanismos internos em instituições como empresas e escolas.

A comunicação é fundamental

Posicionar a violência digital como uma problemática da agenda pública tem sido um trabalho árduo. Hoje, é um tema público. As pesquisas que realizamos a partir da sociedade civil e a pressão pela aprovação da Lei Olimpia contribuíram para isso.

Embora a implementação dessas reformas ainda não seja uma realidade, sua criação teve um impacto social importante, houve uma conscientização pública sobre essa problemática e para isso foi fundamental também a criação de campanhas e mensagens que tornaram esse tema mais acessível.

Precisamos transformar a linguagem jurídica em uma linguagem acessível, pois geralmente ela é complexa e inclusive pode representar um obstáculo para as vítimas. Para o coletivo Luchadoras parte do nosso projeto consistiu na produção de um vídeo com uma linguagem amigável apresentando os resultados da nossa pesquisa.

A capacidade de nomear, entender e saber como funciona o sistema permite ocupar o poder. Entender problemáticas complexas como problemas próximos que nos atravessam também é uma forma de justiça.

Vamos defender o acesso à informação e à transparência

Para nossa pesquisa realizamos inicialmente 219 solicitações de informação pública a promotorias e poderes judiciais em 24 estados do país onde haviam sido aprovadas reformas relacionadas à violência digital até o mês de fevereiro de 2020. Em somente sete estados recebemos respostas das duas autoridades: Aguascalientes, Cidade do México (CDMX), Chihuahua, Jalisco, Nuevo León, Veracruz e Zacatecas; isso nos permitiu realizar uma análise mais completa do trajeto de acesso à justiça frente às duas instâncias.

Assim, conseguimos identificar que, nos últimos três anos, 2.143 investigações foram abertas relacionadas à divulgação de imagens íntimas sem consentimento no México. E que 83% dessas investigações continuam em trâmite.

Nossa pesquisa “justiça em trâmite” não teria sido possível no México se não contássemos com um quadro jurídico e ferramentas para o acesso à informação e à transparência.

O quadro jurídico e as instituições dedicadas à transparência representam um grande avanço para exigir a prestação de contas dos governos em nosso país.