Desde que a Indela nasceu para fortalecer o ecossistema de direitos digitais, nestes três anos apoiou 20 projetos, de 22 organizações, em 10 países da América Latina. As necessidades da região foram mudando com a pandemia e a Indela foi se adaptando de forma ágil e flexível às emergências conjunturais. As principais áreas de impacto que surgiram, e que foram priorizadas para serem abordadas, foram em temas como redução da violência de gênero online, proteção de dados pessoais, privacidade e análise de tecnologias de vigilância em massa, entre outros.

Durante 2021, uma equipe de avaliação externa iniciou um processo de análise para aprofundar a visão estratégica da Indela, o apoio que presta e a colaboração entre pares. Essa avaliação externa incluiu a implementação de espaços para a troca coletiva de reflexões entre as organizações e a equipe coordenadora da Indela, que permitiu identificar as principais oportunidades e desafios futuros que o ecossistema de direitos digitais enfrenta na América Latina.

Oportunidades futuras

Foram identificadas três grandes áreas de oportunidade para continuar fortalecendo a proteção dos direitos digitais em leis e políticas públicas na região.

  1. Novas formas de conectividade e participação: A pandemia, além de confirmar essas deficiências e, diante de uma digitalização crescente, acelerada e em muitos casos forçada, tem levado grupos sociais emergentes, principalmente os jovens, a exigir cada vez mais seus direitos em relação à conectividade e à participação digital. A Internet é um espaço de exercício de direitos em que todas as vozes devem estar presentes.
  2. Novos conceitos: Há uma tendência sobre a possibilidade de novos conceitos de direitos humanos, como o direito à desconexão e o direito à privacidade. Essas novas configurações também andam de mãos dadas com novas demandas de reconhecimento e proteção dos direitos digitais em diferentes países da região, como a conversa sobre o direito de desconectar. Além disso, há um aumento no desenvolvimento de tecnologias mais abertas e transparentes, que podem ter um impacto positivo nas democracias da América Latina.
  3. Novos atores: É preciso incluir atores nas discussões sobre direitos digitais na região, como organizações tradicionais da sociedade civil, centros de pesquisa e órgãos regionais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A ampliação da participação desses setores permite a colaboração para a defesa e proteção dos direitos digitais na América Latina, bem como o desenvolvimento de novos padrões internacionais para a proteção desses direitos no âmbito do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

Os desafios

Identificou-se o aumento de algumas ameaças, e outras novas, que atravessam os direitos digitais e as organizações que os defendem.

  1. Novas desigualdades: A exclusão digital está aumentando as desigualdades sociais existentes na região e no mundo, em alguns casos limitando o acesso e uso de tecnologias digitais, bem como a participação e exercício de direitos no ambiente digital. Por exemplo, o abandono escolar durante a pandemia por falta de acesso à Internet, onde o acesso à educação para crianças e adolescentes é violado. Essas novas desigualdades digitais são mais evidentes para mulheres, jovens, comunidades indígenas e grupos vulneráveis.
  2. Crescimento de movimentos anti-direitos: Embora vários países tenham avançado na proteção dos direitos das mulheres, povos LGTBIQ+ e comunidades indígenas, há um aumento do movimento anti-direitos na região. Isso se traduz em violações de direitos no ambiente digital, bem como no aumento do discurso de ódio e violência digital contra grupos tradicionalmente excluídos.
  3. Leis e políticas em processo de desatualização: Por outro lado, as regulamentações sobre direitos digitais na região ainda não são suficientes para sua proteção. Leis e políticas públicas não estão respondendo aos problemas crescentes, isso se deve, às vezes, à falta de capacidade de alguns governos e atores públicos para entender o impacto das tecnologias digitais no exercício de direitos ou ao lobby das grandes empresas de tecnologias, as Big Tech para conter algumas regulamentações. Diante da ausência de regulamentação protetiva, os Estados continuam implantando sistemas de vigilância massivos que afetam os direitos dos cidadãos, sem transparência ou prestação de contas. A implementação dessas tecnologias, por um lado, viola os direitos à privacidade e à liberdade de expressão online e impede o livre exercício de outros direitos, como organização e mobilização cidadã.

Essas principais oportunidades e desafios que atravessa o ecossistema de direitos digitais na América Latina nos permitem identificar conjuntamente um futuro muito visível e como fortalecer as organizações e a defesa desses direitos. É importante aprofundar os principais eixos temáticos para garantir os direitos digitais em leis e políticas públicas abrangentes, oferecer oportunidades para construir diálogos e articular trabalhos regionais com novos atores, apoiar organizações para fortalecer seu impacto e capacidades neste próximo panorama e alinhar financiamento na região para dar às organizações a oportunidade de construir novos futuros coletivos.